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Semântica Discursiva

A Semântica ocupa-se das questões de significação em uma língua natural. Evidentemente essas questões relativas à significação ou, mais propriamente, à produção de sentidos, perpassam diferentes áreas do conhecimento humano, pois a reflexão sobre os diversos sentidos produzidos em uma sociedade leva, sem dúvida, a uma melhor compreensão da mesma, bem como dos sujeitos que dela participam. Entendemos, desse modo, que as questões semânticas recobrem tanto fatores sintáticos, morfológicos e pragmáticos, como também fatores da ordem do filosófico, do antropológico, do sociológico, dentre tantos campos a ela imbricados. 

Sob essa perspectiva, a linguagem é entendida como constituidora de saberes e sujeitos. Trata-se de uma perspectiva que considera o sentido como sendo de natureza conjuntural, dependente de fatores variados para se constituir.

Desse modo, não só o discurso é da ordem da história ou da ordem da ideologia, mas também o sistema linguístico, enquanto sistema de relações obrigadas, de imposições sociais e culturais, que varia segundo a comunidade, é da ordem da história, evidentemente.

Por exemplo, sob o prisma da discursividade, o presente do indicativo não é simplesmente um quadro dentro do paradigma das conjugações verbais. A cada situação discursiva as construções de presente adquirem valores inusitados, atualizando fatos passados, ao substituírem as formas do pretérito, como por exemplo: - Em 1964 ocorre o golpe militar no Brasil - ; presentificando o futuro, quando em lugar das formas de futuro, como quando se diz: - Vou amanhã. -; estabelecendo uma ideia de contemporaneidade coletiva – Hoje é primavera.-; ou de verdade permanente, como quando se diz que - A terra é redonda. -; ou ainda, transportando os fatos para uma situação de presente estendido: - Moro em Vitória. Portanto, essas construções fazem parte não apenas de estratégias argumentativas, mas de organizações sistêmicas que estruturam os discursos de um tempo, de um local, que estruturam, enfim, “formas de vida”, como diria Wittgenstein (1984).

Já em 1977 o professor Milton José Pinto em seu livro: Análise Semântica de línguas naturais: caminhos e obstáculos, apontava para a interdisciplinaridade do fato semântico:

 

Tal projeto, pelo recurso à interdisciplinaridade, tem o que assustar os linguistas mais conservadores, mas traz de volta aos estudos de linguagem uma certa tradição humanística hoje abandonada. O fato é que a significação está na raiz de todos os fenômenos de que o ser humano é participante, e nenhuma ciência humana poderá se constituir sem levar isso em conta. (Pinto, 1977, pág. 13)

 

E ao final desse mesmo livro o autor acrescenta como uma das perspectivas de desenvolvimento na área da Semântica “uma Semântica discursiva, baseada no desenvolvimento de uma teoria dos discursos” (Idem, pág. 90).

Quanta diferença não faria treinar nos alunos um olhar sobre as estruturações discursivas? Isso implicaria em um novo entendimento da complexidade na relação do homem com a linguagem, considerando esta não só como instrumento, mas como fenômeno complexo e nem por isso inabordável. Uma linguagem viva, pulsante, que reflete em si os modos de existência e não meros paradigmas verbais, frios de gente. Lembrando o cantor e compositor Gonzaguinha, uma linguagem que se faz “jogo do trabalho na dança das mãos”.

Restam-nos, pesquisadores e professores da área, fazer com que a Semântica incorpore as discussões mais recentes e caminhe de retorno ao homem, fonte inesgotável do sentido, procurando abrir nossas aulas à plenitude dos sentidos.

 

 

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